A Federação Única dos Petroleiros (FUP) e seus sindicatos foram surpreendidos com a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de autorizar a venda da Refinaria Landulpho Alves (RLAM), na Bahia, para o fundo Mubadala, dos Emirados Árabes, por US$ 1,65 bilhão – abaixo de todas as avaliações de mercado, inclusive a feita pela própria Petrobrás, que inicialmente precificou a planta em US$ 3,04 bilhões.
Como o aval do órgão de controle causa prejuízo não apenas à petroleira, mas à toda a sociedade brasileira, a FUP e seus sindicatos vão reforçar as ações judiciais contra a venda da planta “a preço de banana”. E também vão ampliar a articulação política no Congresso Nacional para impedir a entrega do patrimônio público nacional – o que envolve não apenas a refinaria baiana, mas outras plantas de refino e ativos que a gestão da Petrobrás está privatizando.
“Qualquer decisão que não seja a suspensão da venda da RLAM é injusta. Não podemos concordar com a conclusão do TCU", afirmou o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar.
"Não há justificativa alguma a gestão da Petrobrás dar um desconto de 50% no valor de mercado da refinaria", ressaltou Deyvid, que completou: "Estamos com ações judiciais questionando o valor aviltado. Há também Reclamação do Congresso Nacional, assinado à época pelas mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, questionando a privatização das refinarias da Petrobrás sem autorização legislativa e licitação”.
O dirigente explicou que, após acórdão sobre o tema da venda das refinarias, o Senado Federal interpôs Embargos de Declaração questionando pontos importantes que podem impedir a privatização e a venda das refinarias da Petrobrás. “E tomaremos outras medidas judiciais, quantas mais forem necessárias”, disse..
Bacelar lembra que a decisão do TCU é de ordem administrativa. Portanto, pode ser revertida judicialmente.
O processo no TCU foi resultado de denúncia feita pelo Sindicato dos Petroleiros da Bahia (Sindipetro-BA), filiado à FUP, contra a venda da RLAM por preço aviltado e abaixo do mercado. A denúncia também recebeu reforços de deputados e senadores de oposição.
A RLAM é a segunda maior refinaria do país e produz combustíveis de alto valor agregado, como o óleo bunker de baixo enxofre para navios, que vem sendo muito requisitado no mercado global. Análises técnicas do Instituto Nacional de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) precificaram a unidade entre US$ 3bilhões e US$ 4 bilhões, considerando o fluxo de caixa descontado. Se confirmada, a venda, portanto, se dará a 50% do valor de mercado.
Além da Petrobrás e do Ineep, o banco BTG Pactual também apontou que o valor de venda da RLAM foi 35% menor. E a XP Investimentos também criticou a subavaliação de preço, mesmo tendo feito ajustes recentemente, e apontou que a venda da refinaria baiana irá contribuir muito pouco com a redução do endividamento da Petrobrás – argumento usado pela gestão da petroleira para justificar o negócio.
OUTRAS AÇÕES EM CURSO
Em paralelo, também a Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários da Petrobras (Anapetro) entrou com representação na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) contra atos lesivos ao patrimônio da Petrobrás e aos interesses de acionistas minoritários.
Há ainda uma ação popular na Justiça Federal do Distrito Federal contra a privatização da RLAM; e ação civil pública na Justiça Federal da Bahia sobre os impactos econômicos e sociais da saída da Petrobrás do estado.
Os senadores Jacques Wagner (PT/BA) e Otto Alencar (PSB/BA), juntamente com a FUP e o Sindipetro-BA, também entraram com ação popular contra o preço de avaliação da RLAM. O processo pede a paralisação da venda da refinaria.
ENTENDA O CASO DA VENDA DA RLAM A PREÇO VIL
No início de abril, uma semana após a Petrobrás assinar contrato de venda da RLAM com o fundo Mubadala por US$ 1,65 bilhão, o ministro Walton Alencar Rodrigues, do Tribunal de Contas da União (TCU), relator da denúncia sobre o preço vil, pediu que a equipe técnica do órgão apresentasse um parecer sobre o valor da operação, para, então, decidir se suspenderia ou não a privatização da refinaria. O prazo dado para a análise terminou em 12 de abril, mas o julgamento da análise ocorreu na tarde desta quarta-feira (12/5).
Na ocasião, Rodrigues afirmou que “tem havido uma agilização extremamente enfática do procedimento por parte da Petrobrás, para concluir a questão antes da conclusão do procedimento no âmbito do controle externo”.
Outro ministro do TCU, Bruno Dantas, completou que a diretoria da Petrobrás estaria sujeita a punições, caso fosse confirmada a venda a preço vil.“Um alerta que a questão se encontra sob análise urgente do tribunal e, evidentemente, se a Petrobrás concluir o negócio [...], os seus diretores executivos se sujeitarão às responsabilidades que forem extraídas da apreciação que o TCU vier a fazer”, disse.
Deyvid Bacelar, da FUP, recorda que o contrato de venda da RLAM não foi aprovado por unanimidade pelo Conselho de Administração da Petrobrás e foi assinado sem o aval final dos ministros do TCU. Além disso, a operação foi objeto de várias críticas da Controladoria Geral da União (CGU), e a Procuradoria do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) determinou que a Petrobrás não fechasse qualquer contrato de venda de suas refinarias sem aprovação prévia do órgão.
É importante frisar que a venda da RLAM acarretará na formação de um monopólio privado na oferta de combustíveis na Bahia e em todo a região Nordeste. Tal cenário foi constatado por estudo da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e por uma análise do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Se a venda da RLAM for concluída, o fundo Mubadalavai adquirir um mercado relevante com um cenário difícil para a entrada de concorrentes, já que as refinarias da Petrobrás foram implantadas para garantir o abastecimento de mercados regionais, não para concorrer umas com as outras. Assim, poderá adotar preços que maximizem o seu retorno financeiro. Isso causará aumento dos preços dos combustíveis. Há ainda risco de desabastecimento, principalmente de gás de cozinha, apontado pela própria Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Outro efeito da venda da RLAM será a efetivação da política de reajustes dos combustíveis adotada pelas gestões da Petrobrás desde 2016, baseada no Preço de Paridade de Importação (PPI). Essa política considera os preços do petróleo no mercado internacional e da cotação do dólar, mesmo quando as refinarias da Petrobrás no país – que respondem por cerca de 90% dos derivados consumidos no Brasil – usam petróleo nacional.
Por isso, a FUP e seus sindicatos defendem o estabelecimento de uma política de Estado para os combustíveis que considere os custos nacionais de produção, em equilíbrio com parâmetros internacionais, já que o petróleo é uma commodity.