Notícia - Souto Maior faz severas críticas à reforma trabalhista em sua posse como desembargador

"A Lei n. 13.467/17 (reforma trabalhista) criou mais de duzentas fórmulas voltadas ao fortalecimento do poder econômico das grandes empresas, tornando ainda mais vulneráveis os trabalhadores, suas organizações sindicais e as instituições estatais voltadas à regulação social", afirmou o juiz Jorge Luiz Souto Maior, em sua cerimônia de posse como desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 15a região, na segunda-feira (17), em Campinas.

Souto Maior fez um longo discurso com duras críticas à "reforma" trabalhista, que classificou como "altamente regressiva" para toda a sociedade brasileira. Ele desconstruiu a lei sob todos os pontos de vista: jurídico, econômico, social e trabalhista. Não deixou pedra sobre pedra.

Vale à pena a leitura do texto, que traz fundamentos preciosos para compreender como a nova lei vai contra tudo que já se fez no país pela construção de uma rede de garantias trabalhistas e de bem estar social mínima.

Leia abaixo o discurso na íntegra: 

I-

Inicio a minha fala, deixando claro que estou extremamente feliz com tudo isso: a promoção; a forma generosa e amigável pela qual estou sendo recebido aqui no Tribunal, e, também, com esse evento maravilhoso, com a presença de tantas pessoas queridas.

Confesso que sonhei acordado, milhares de vezes, com esse momento – afinal, a antiguidade, pelo bem ou pelo mal, chega – e toda vez ficava imaginando o que dizer. Imaginei muitas falas. Colhi frases de efeito. Até que me veio à mente a conclusão inevitável: a de que eu deveria, simplesmente, dizer o óbvio; não me fazer passar pelo que não sou; e falar de modo específico desse momento, de todos nós, de nossas vidas...

Nesse aspecto, embora seja óbvio, é preciso reafirmar que essa não é uma conquista pessoal, individual. E isso não é uma retórica, pois vejo aqui, de forma explícita, representados, todos os momentos da minha vida, em que as pessoas, muitas que aqui estão, foram tentando me transmitir valores e ensinamentos, moldando e constituindo a minha condição humana. 

IV-

Foi em Pouso Alegre, também, onde me formei na prestigiosa Faculdade de Direito do Sul de Minas, que tive a honra de ser aluno de Luiz Otávio Linhares Renault, Marçal Etienne Arreguy e Márcio Túlio Viana, que me conduziram ao mundo enigmático e fascinante do Direito, e, em especial, do Direito do Trabalho. Obrigado, mestres! E, em especial ao Márcio Túlio Viana, aqui presente, que abriu um caminho para tantos que, como eu, tiveram a sabedoria de seguir.

Fui para São Paulo em 1989, prosseguindo os estudos sobre o Direito do Trabalho. Ingressei, por concurso público na magistratura trabalhista, em 1993. E, também por concurso público, passei a exercer a função de professor na Faculdade de Direito da USP, em 2002.

Desde 1989, me deparei com uma gama enorme de novos mestres, amigos, amigas, companheiros, companheiras e colegas, os quais se somaram à história da constituição do meu ser.

E os vejo todos aqui. Novos amigos do futebol e da pizza; colegas de trabalho e parceiros: juízes, juízas, desembargadores, desembargadoras, procuradores e procuradoras do trabalho; advogados e advogadas trabalhistas; professores e professoras; servidores e servidoras da Justiça do Trabalho; trabalhadores e trabalhadoras da Universidade de São Paulo; trabalhadoras e trabalhadores terceirizados...
 
V-

O curioso dessa história é que essa nossa geração, nascida na década de 60, e que até ficou conhecida como “geração coca-cola”, vez que foi formada sem maiores preocupações políticas, desenvolveu um modo de ser muito peculiar de ser, baseado na dependência de inter-relações pessoais, de círculos de amizade, de apoios e de incentivos recíprocos.

Isso permitiu o fortalecimento, pelo exercício cotidiano, de sentimentos como a da solidariedade, da confiança, da tolerância e da alteridade. São esses valores, aliás, que fazem com que tantas pessoas se sintam verdadeiramente felizes com esse momento, que também diz respeito às suas próprias vidas.
 
VI-

Essa energia canalizada em direção de um novo pacto de solidariedade social eclode na década de 80 e vai se consolidar nos termos da Constituição da República, em 05 de outubro de 1988.

Ocorre que, coincidentemente, 1989, foi também o ano em que o neoliberalismo avança sem freios sobre o Brasil, colocando sob intenso ataque não só esses valores humanos como todo o projeto social e econômico que fora constitucionalizado.

Na Constituição de 1988, não por acaso, se estabeleceram limites ao poder econômico para que fossem atendidos os ditames da justiça social (art. 170 da CF), a função social da propriedade (art. 5º, XXIII, da CF), a preservação da dignidade humana (art. 1º, III, da CF), os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, IV, da CF), vislumbrando a prevalência dos Direitos Humanos (art. 4º, II, da CF) e a melhoria da condição social dos trabalhadores (art. 7º, I, da CF).
 
VII-

Mas é claro que só mesmo nas mentes de pessoas tão desavisadas como nós éramos é que se podia imaginar que bastariam esses laços de amizade e essa empolgação democrática e humanista para consagrar um Estado Social no Brasil.

Movidos pela emoção, desconsideramos que ainda carregávamos uma base social, política e econômica forjada por um convívio de quase 400 anos com a escravidão, e, também, por uma experiência frustrada pertinente à formalização incompleta de direitos sociais, seguida de um longo período de desmonte desses mesmos direitos.

A Constituição da República de 1988, quebrando um roteiro de 488 anos, refletiu um anseio de milhões de pessoas, mas que não estava completamente assumido por todos, sobretudo no que se refere aos projetos da “melhoria da condição social dos trabalhadores” (art. 7º) e dos objetivos de “I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional;  III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (art. 3º).

Lembre-se que o ano de 1988 foi marcado por forte repressão aos movimentos sociais, com mais de 50 pessoas ligadas às causas trabalhistas assassinadas[i] e a mera declaração formal dos preceitos fixados na Constituição, por si, não alterou o rumo das coisas, tanto que, em dezembro de 1988, o líder sindical e ecologista, Chico Mendes, foi assassinado. Além disso, no dia 9 de novembro de 1988, uma greve em Volta Redonda foi fortemente reprimida; como se deu, anos depois, em 1995, na greve dos petroleiros.
 
VIII-

O fato é que de 1989 em diante o que se viu foi uma recorrente destruição da Constituição, mas que, por outro lado, foi rivalizada por uma intensa “luta” jurídica que procurava fazer valer, em concreto, os preceitos sociais fixados na Constituição da República.

Tem sido marcante a atuação neste sentido do Ministério Público do Trabalho, da Justiça do Trabalho, do Ministério do Trabalho e da advocacia trabalhista e não é por acaso, portanto, que essas mesmas instituições e as pessoas que as integram têm sido alvo de tantos ataques midiáticos – o que ocorreu, de forma mais intensa, desde 2016, mas que se deu, igualmente, na década de 90 e nos anos de 2008 e 2009.

E quando a gente reflete sobre qual seria a razão desses ataques, a resposta é um tanto quanto reveladora e entristecedora: a constatação é que o “problema” se deu porque essas instituições, que, paradoxalmente, tiveram suas estruturas reforçadas a partir da década de 90,  procuraram cumprir a sua função institucional de efetivar os preceitos jurídicos constitucionais trabalhistas.

A fiscalização do trabalho no meio rural, por exemplo, somente passou a ser prevista formalmente em 1994, com a edição da Instrução Normativa n. 24, e se iniciou, de fato, em 1995, com a criação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, do Ministério do Trabalho, com o objetivo de averiguar as denúncias de trabalho escravo e isso só ocorreu depois, em 1993, a OIT, havia divulgado um relatório que trazia dados relativos a 8.986 denúncias de trabalho escravo no Brasil.

Mas a presença fiscalizatória do Estado no trabalho rural não foi muito bem recebida nas estruturais arcaicas do poder e isso motivou, em 28 de janeiro de 2004, o assassinato de três auditores fiscais e de um motorista, servidor do Ministério do Trabalho, em Unaí/MG. Não por acaso, a data de 28 de janeiro passou a ser “Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo”.

De todo modo, muitos têm sido os profissionais abnegados no exercício do seu mister neste sentido da defesa dos direitos sociais no Brasil, que seria impossível fazer menção a todos, como seriam, também, graves as omissões. Ainda assim, não posso deixar de citar dois desses nomes, que estão aqui entre nós hoje: o Desembargador da 10ª Região, Grijalbo Fernandes Coutinho; e a juíza do trabalho da 4ª Região, Valdete Souto Severo, que, com sua inteligência e perseverança, nos impulsionam e não nos deixam desistir.
 
IX-

E quando, motivado pelas reflexões que este momento me traz, passo em revista o que foi a minha vida na Justiça do Trabalho desde 1993, consigo entender bem todo esse processo histórico.

Outro dia, falava com a Giovanna a respeito. De fato, estávamos comemorando a promoção, mas a frase que sobreveio foi: “não precisava ter sido tão sofrido”.

Foram, certamente, como estou destacando, muitos momentos felizes, de formação de vínculos sólidos e sadios de amizade. As audiências na 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí, onde atuei durante 20 anos, eram, na enorme maioria das vezes, agradáveis, como era agradável o convívio, na secretaria da Vara ou fora dali, com os servidores e servidoras. Momentos engraçados para contar não faltam... Mas o que ficou mais marcado é a sensação de se ter implementado uma luta diária para conseguir fazer valer, em concreto, a ordem jurídica trabalhista, como se isso constituísse um ato ilícito.

Quantas não foram as vezes em que recusei a homologar um acordo porque o valor apresentado não era suficiente sequer para pagar as verbas rescisórias incontroversas, o que representava, portanto, renúncia a direito de ordem pública, dada a repercussão inclusive na ordem econômica, que essa renúncia poderia provocar, e as partes se voltaram contra mim, como se eu estivesse cometendo um ato ilícito?!

Ou quando recusava aceitar uma discriminação, em acordo, de parcelas unicamente com natureza indenizatória, vez que isso representava um atentado ao custeio da seguridade social, e olhares se voltavam contra mim como se eu estivesse agindo errado.

Inúmeros momentos reforçam essa sensação, como, por exemplo, a situação vivida, em meados dos anos 2000, quando, por diversos motivos, a secretaria da 3ª Vara de Jundiaí, onde eu atuava, restou reduzida ao número de 4 servidores apenas (num total ideal de 12). Para auxiliar, eu fazia audiências, atendia balcão e despachava os processos a mão. Em um dia, quando vi 2.000 processos espalhados no chão da Vara, esperando andamento, eu me sentei em cima de uma pilha e chorei, ao mesmo tempo em que ia pegando, um a um, os processos e dando o encaminhamento.

Vários foram os mutirões, nos quais os servidores se desdobraram para colocar os serviços em ordem.

Tantos foram os juízes e as juízas que passaram na Vara, dentre outros, José Antônio Gomes de Oliveira, Kathleen Mecchi Zarins Stamato, Alessandra Regina Trevisan Lambert, Patrícia Maeda e nosso querido e saudoso Saint-Clair Lima e Silva, que também contribuíram sobremaneira nessas tarefas, especialmente com a realização de um número fora dos padrões de normalidade de audiências e, consequentemente, de sentenças.

Durante um semestre inteiro, inclusive, me foi imposta a realização de audiências de segunda a sexta-feira, de manhã e de tarde.

Mas tudo isso – e muito mais, que o tempo me impede de relatar – criou entre os servidores um comprometimento tão grande com os resultados dos nossos trabalhados. Isso se expressou de forma marcante, quando, em um dia, chegando para trabalhar, me deparei com todos os servidores celebrando. O motivo da comemoração era o fato de que um Ministro do STJ havia revogado uma decisão que nos impedia de liberar um valor penhorado para um grande número de reclamantes em um processo. Diante da nova realidade processual, já se adiantaram e confeccionaram os alvarás, que, assim, estavam prontos, esperando apenas minha assinatura (o que fiz, imediatamente, claro).

O interessante – ou trágico, em certo sentido – é que essas dificuldades, como já dito, advinham de uma forma de atuar em que se buscava, pura e simplesmente, o respeito estrito da lei, na mesma linha de tantos outros colegas já referidos.
 
X-

E por que é relevante expressar isso neste instante?

Para deixar bem claro que essa pessoa que agora toma posse como Desembargador na 15ª Região é a mesma que estava atuando até o começo deste ano na 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí e que renova neste ato, publicamente, o compromisso de continuar preservando a autoridade da ordem jurídica trabalhista, o que requer, como determina a base principiológica, história e conceitual do Direito do Trabalho, uma visão de mundo que parta das angústias dos trabalhadores e das trabalhadoras.

Vi, ao longo da minha vida, muitas pessoas que ao galgarem postos de maior evidência social passaram a adotar postura diversa daquela que manifestavam até então, como se a cada conquista alcançada fosse preciso morrer um pouco e como se a radicalidade estivesse condenada a ficar na periferia.

Inúmeras vezes ouvi o argumento de que aquele não seria “o momento oportuno” para dizer ou fazer algo, quase sempre acoplado da justificativa de se estar sob uma condição probatória. Mas o que é a vida senão um grande estágio probatório?

Cheguei até aqui carregado dos ensinamentos e exemplos de todos vocês, mas, claro, formei as minhas compreensões e a minha ideologia e sempre as expressei, respeitando as posições contrárias e me segurando diante das diversidades e até animosidades. Não enganei a ninguém, e não tenho, portanto, porque abandonar meus ideais de mundo.

Meus compromissos estão fincados no respeito à coerência de toda essa trajetória, que pretende, claro, se renovar a cada dia, com novos e constantes aprendizados.

Sei que, atuando em um órgão colegiado, devo respeitar – e sempre o fiz – a opinião da maioria, mas isso não me impede de ser eu mesmo e de continuar cumprindo o papel de dar voz, no plano jurídico, aos anseios da classe trabalhadora brasileira, no sentido de reconhecer, declarar e efetivar os seus direitos, historicamente conquistados.

O que não se trata, portanto, de qualquer tipo de favor, mas do mero cumprimento de um dever funcional.
 
XI-

Vejamos, por exemplo, o que se passa, atualmente, com o Direito do Trabalho.

A grande questão é que não se pode deixar levar pelas necessárias formas do convívio diplomático, relevante no trato institucional, e, com isso, assumir uma postura alheia ao real, porque, antes de tudo, o que está em jogo é a nossa credibilidade e a nossa dignidade enquanto seres humanos, que são também a credibilidade e a dignidades das instituições.

O fato real e insofismável é que os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras no Brasil foram alvo de uma atuação legislativa altamente regressiva.

Não houve uma “reforma” trabalhista, como se costuma dizer, pois uma autêntica reforma teria que considerar todos os aspectos da regulação trabalhista, sobretudo os que pudessem contribuir para democratizar as relações de trabalho, favorecer o efetivo diálogo social, minorar as desigualdades econômicas e melhorar a condição social dos trabalhadores, como determina, aliás, o art. 7º da CF. Com isso, uma reforma trabalhista em momento de crise procuraria efetivar a garantia no emprego; favorecer o exercício do direito de greve; e reduzir a jornada de trabalho.

Lembre-se que os direitos trabalhistas foram consagrados de forma mais efetiva durante o período de maior crise do modelo de sociedade capitalista, no final das grandes guerras mundiais.

No entanto, a Lei n. 13.467/17 criou mais de duzentas fórmulas voltadas ao fortalecimento do poder econômico das grandes empresas, tornando ainda mais vulneráveis os trabalhadores, suas organizações sindicais e as instituições estatais voltadas à regulação social.

Isso por si só é fator de aumento do sofrimento e de conflitos no ambiente de trabalho, estimulando, também, a concorrência fratricida entre as empresas.

Resultado: aumento da precarização; redução concreta de direitos; acumulação ainda maior da riqueza produzida; diminuição do consumo; desemprego e desalento; destruição do projeto constitucional de Estado Social Democrático de Direito.

Não é por acaso, portanto, que viu nos jornais outro dia a seguinte notícia: "As remessas de lucros e dividendos feitas por empresas estrangeiras com sede no País somaram US$ 5,109 bilhões em agosto, segundo dados divulgados nesta sexta-feira (23) pelo Banco Central (BC). O resultado representa o maior volume de remessas no mês desde o início da série histórica, iniciada em 1947."[ii]

Enquanto isso, no Brasil, o que se constata, além do aumento do desemprego e do subemprego, é o aumento da miséria[iii] e, consequentemente, o aumento da desigualdade social[iv], sendo que, precisamente, já se chegou, aqui, no último período, ao resultado de que a renda dos 1% mais ricos foi 36 vezes superior à média dos mais pobres, sendo que nem mesmo esse acúmulo fica no país, já que os ricos aumentaram, de forma recorde, o volume de suas remessas ao exterior[v].

Além disso, a dita “reforma” reforça toda estrutura histórica de fosso social e de exclusão, de preconceito e de discriminação no Brasil, vez que os mais atingidos pelo desmonte da rede de proteção social são os excluídos de sempre: “Entre os que desistiram de procurar emprego, pretos e pardos são a maioria, representando 73,1% desse contingente. Do total, 23,4% têm entre 18 e 24 anos, e 38,4%, ensino fundamental incompleto.”[vi]
 
XII-

Sob o prisma estritamente técnico-jurídico, não se pode mesmo deixar de apontar a ilegitimidade da lei da “reforma” trabalhista.

Ora, no Estado Democrático de Direito só tem autoridade de lei a regulamentação que emerge da vontade popular, que, nas democracias representativas, se substitui pelas instituições que, pelo voto, atuam no processo legislativo, regulado constitucionalmente.

A garantia mínima que os cidadãos possuem de que as leis, que vão regular a sua vida em sociedade, reverberarem seus anseios coletiva e democraticamente concebidos, é a de que a elaboração das leis deve respeitar às regras do processo legislativo.

O vício formal na elaboração de uma lei gera o efeito inevitável da perda de sua legitimidade, que sequer precisa ser declarada judicialmente tal é a gravidade da irregularidade.

Para quem não sabe, é importante informar que o projeto de lei (PL 6.787), que deu origem ao advento da lei da “reforma”, foi apresentado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional em 23 de dezembro de 2016, como resposta estratégica a uma crise política. Tratava de poucos assuntos, em meros 7 artigos.

Começou a tramitar efetivamente em 9 de fevereiro de 2017 e em 24 de abril do mesmo ano já estava com relatório final concluído, trazendo mais de 200 alterações na CLT, tratando de todos os assuntos.

Esse texto final tramitou em regime de urgência na Câmara dos Deputados e no Senado e em 11 de julho de 2017 se tornou, formalmente, uma lei.

Afora o tempo recorde de tramitação na Câmara (dois meses) e o fato de que o texto final do PL 6.787 não passou por qualquer discussão nas Comissões daquela Casa, não tendo sido, inclusive, alvo de audiências públicas ou diálogo com as entidades representativas de trabalhadores, como preconiza a Convenção 144 da OIT, há um outro aspecto ainda mais grave e insuperável: os Senadores não votaram o texto que lhes foi submetido.

Aprovaram, isto sim, um texto ainda inexistente. Explico: o relatório final do senador Ricardo Ferraço apontava diversas impropriedades e inconstitucionalidades do projeto de lei, mas remetia ao Presidente da República a tarefa de realizar os acertos, por intermédio da edição de uma Medida Provisória, cujo teor, no entanto, não se tinha.

O que se votou, portanto, foi um texto com teor desconhecido. Esse fato, de domínio público, é mais que suficiente para afirmar a ilegitimidade da Lei n. 13.467/17.

A lei foi publicada no Diário Oficial da União em 14 de julho de 2017, com vigência prevista para o dia 11 de novembro do mesmo ano, mas passados quase quatro meses a Medida Provisória não foi editada e, assim, a lei entrou em vigor sem que a tal “correção” tivesse vindo, em clara demonstração, inclusive, de que não era de “pequenos defeitos” que se cuidava.

A Medida Provisória (MP 808) só veio ao mundo jurídico em 14 de novembro de 2017, promovendo 84 alterações na Lei n. 13.467/17.

Depois disso, o Congresso Nacional teve quatro meses para aprovar a MP 808, mas não o fez.

Resultado: em 23 de abril de 2017, como se sabe, a MP 808 caducou.  

Entre outras razões, isso se deu também porque foram apresentadas 967 emendas à MP. Elas tratavam de diversos assuntos, em nova e inequívoca demonstração da quantidade de problemas jurídicos suscitados pela lei.

Então, se havia alguma legitimidade no procedimento adotado – o Senado transferir para o presidente da República a atividade legislativa --, o fato concreto é que mesmo esse procedimento não foi cumprido, o que faz da Lei n. 13.467/17 um texto não aprovado por um procedimento legislativo regular, impondo-se reconhecer, por conseguinte, que há  uma impropriedade jurídica em tratá-la como uma lei como outra qualquer.

Lembre-se que, em atitude de desespero, para tentar salvar a “lei”, foi editada, no âmbito do Ministério do Trabalho, em 23 de maio de 2018, a Portaria n. 349, buscando alterar vários dispositivos da Lei n. 13.467/17.

Mas, com tal procedimento, só se conseguiu deixar ainda mais nítido o quanto a lei da “reforma” é mal elaborada e de quase impossível aplicação prática, maltratando, na prática, empregados e muitos empregadores e, criando ainda mais obstáculos ao desenvolvimento econômico nacional, para regozijo do capital financeiro internacional.
 
XIII-

E mesmo do ponto de vista econômico a insistência com a Lei n. 13.467/17 é um grave equívoco, a não ser se tiver como interesse apenas os efeitos imediatos de grandes empresas que se sustentam com capital estrangeiro e comercializam seus produtos em outros países, isso porque a lei, além de diminuir o potencial consumidor dos trabalhadores, ainda gera enormes inseguranças jurídicas.

- A lei:
 
1) tenta diminuir o alcance do grupo econômico, mas o amplia;
 
“Art. 2o  ................................................................
..................................................................................... 
§ 2o  Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego. 
§ 3o Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes.”
 
2) tenta acabar com a hora “in itinere”, mas, concretamente, não o faz;
 
“Art. 4o  ................................................................ 
§ 1º  Computar-se-ão, na contagem de tempo de serviço, para efeito de indenização e estabilidade, os períodos em que o empregado estiver afastado do trabalho prestando serviço militar e por motivo de acidente do trabalho.”
 
3) tenta fazer com que o negociado prevaleça sobre o negociado, mas concretamente, não o faz;
 
“Art. 8o  ................................................................. 
§ 3o  No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva.”
 
4) tenta regular o trabalho intermitente, para o alastra de tal modo que o torno inaplicável como dispositivo para um trabalho essencial intermitente;
 
“Art. 443.  O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.
.................................................................................... 
§ 3o  Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.”
 
5) tenta criar o trabalhador autônomo exclusivo e, de forma contraditória, o empregado, intermitente e não exclusivo;
 
“Art. 442-B.  A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3o desta Consolidação.”  
 
6) tenta dizer que limitação da jornada não é questão ligada a saúde e segurança do trabalho;
 
“Art. 611-B.  Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:
Parágrafo único.  Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo.” 
 
7) tenta criar acordo individual, inclusive tácito, para compensação de jornada, ao mesmo tempo que remete aos requisitos Constitucionais, que não admite tal possibilidade;
 
Art. 59.  A duração diária do trabalho poderá ser acrescida de horas extras, em número não excedente de duas, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. 
(...)
§ 5º  O banco de horas de que trata o § 2o deste artigo poderá ser pactuado por acordo individual escrito, desde que a compensação ocorra no período máximo de seis meses.
§ 6o  É lícito o regime de compensação de jornada estabelecido por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês.” (NR)
Art. 59-A.  Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação.”
“Art. 611-A.  A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre: 
I - pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;”
 
8) tenta ampliar ao máximo a terceirização, mas, com isso, por preceito de ordem lógica, elimina a terceirização enquanto um instituto jurídico específico;
 
“Art. 2o  A Lei no 6.019, de 3 de janeiro de 1974, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 4o-A.  Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução.”
 
9) tenta dificultar a elaboração da petição inicial, mas, concretamente, não o faz;
 
“Art. 840.  ..............................................................
§ 1o  Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.”
 
10) tenta limitar a concessão da assistência gratuita, mas não consegue;
 
“Art. 790.  .............................................................
.....................................................................................
§ 3o  É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.
§ 4o  O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.”
 
11) tenta criar a assistência gratuita onerosa, mas o faz de forma tão grotesca que é impossível reconhecer validade jurídica a tal preceito.
 
“Art. 791-A ......
(...)
§ 4o  Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.”
 
XIV-

Como se vê, a lei nos conduz a uma autêntica balbúrdia jurídica e talvez esse seja um efeito programado, para, pervertendo os fatos, abalar a credibilidade das instituições que se vejam com a tarefa irrealizável de conferir alguma coerência e previsibilidade aos dispositivos da “reforma”.

Vejamos de forma mais específica a questão da terceirização, que, inclusive, foi alvo de decisão recente do Supremo Tribunal Federal.

As Leis ns. 13.429/17 e 13.467/17, pelas quais se pretendia ampliar de forma irrestrita a terceirização, não disseram isso explicitamente. As duas leis, aliás, não trazem a palavra terceirização. Tratam de “transferência de atividade”, que pode ser entendida como divisão do processo produtivo, ou subcontratação produtiva, que nada tem a ver com mera intermediação de mão-de-obra, que é rechaçada pela OIT desde os primórdios do Direito do Trabalho.

A recente decisão do STF, cujo teor ainda não se conhece por inteiro, traz o termo terceirização, mas não define o instituto. Diz que pode haver contrato livre entre as empresas. Mas isso sempre foi possível. E relação de emprego é instituto jurídico que transcende os contratos, seguindo os padrões dos arts. 2º e 3º da CLT, que não foram revogados (aliás, tiveram sua aplicação ampliada), cujo reconhecimento, inclusive, não gera invalidação dos contratos formulados.

O STF, claramente, se apressou para abrir espaço à ampliação da terceirização, mas para fazê-lo criou complicadores jurídicos ainda maiores. Reparem que a decisão do STF foi proferida no âmbito de uma ação em que se discutiam os termos da Súmula 331 do TST, mas depois da propositura dessa ação advieram as leis antes referidas e a decisão do STF chega a contrariar até mesmo os termos legais.

Mas a questão mais grave neste tema, como de resto se verifica em toda a “reforma”, é a forma como se procura emplacar as supostas novidades jurídicas. Atendendo a esse propósito, dois direcionamentos se destacam: a) o revisionismo histórico; b) e a perversão de valores.

No primeiro, faz-se vistas grossas de toda a história de sofrimento da classe trabalhadora no Brasil, a qual somente passa a ter direitos formalmente consagrados, de maneira generalizada, em 1930, mas que jamais foram envolvidos em uma política institucional eficaz de efetivação. Lembre-se que no meio rural a legislação trabalhista como um todo somente foi aplicável a partir de 1988 e com atuação fiscalizatória institucionalizada apenas em 1995.

Com isso, além de alterar a realidade histórica, fazendo transparecer que os trabalhadores brasileiros são privilegiados, quando, de fato, são superexplorados, jurídica e economicamente, ainda se abandona qualquer tipo de análise dos problemas reais do país no que tange à desigualdade social e à evasão de divisas.

No segundo, que é uma consequência do primeiro, procura-se transformar os trabalhadores em culpados pela crise econômica e busca-se conduzir para os trabalhadores, por meio da redução de seus direitos, a responsabilidade de salvar o país da crise e de melhorar a vida dos excluídos, como se estes não fossem uma fração da classe trabalhadora e como se a exclusão não fosse, ela própria, um processo histórico fruto da má distribuição da riqueza e da ausência de políticas efetivas de inclusão, notadamente no que se refere à educação pública.

Com esse desvio de perspectiva, reforça-se uma estrutura que promove ainda maior acumulação de riqueza, sob o argumento de que está tentando resolver o problema da exclusão. Mas, de fato, colocam-se os trabalhadores distribuindo entre si uma parcela ainda menor do PIB nacional. Difunde-se uma fórmula esdrúxula e cínica de distribuição da pobreza, para enfrentar o problema da exclusão, ao mesmo tempo em que se proporciona uma maior acumulação da riqueza produzida.

Esses dois direcionamentos estão bem claros nos argumentos dos Ministros que votaram a favor da ampliação da terceirização.

O Ministro Luís Roberto Barroso chegou a dizer que a terceirização é boa para os trabalhadores e a sua convicção neste sentido, contrariando todos os estudos já feitos por diversos profissionais das mais variadas áreas do conhecimento, foi uma conversa que ele teve com um terceirizado em um aeroporto.

Segundo o Ministro, o terceirizado disse que havia perdido o emprego e a terceirização foi, para ele, a oportunidade para estar novamente empregado e, embora o salário fosse menor, tinha a oportunidade de ter três empregos e assim compensar os ganhos mais baixos.

Percebam que esse raciocínio, baseado na lógica do mal menor, é o mesmo que justificou, em determinados momentos da história da humanidade, os mais diversos tipos de opressão, inclusive, a própria escravidão negra.

Mas se quisesse saber mesmo o que representa a terceirização na vida de um trabalhador, o Ministro poderia ter conversado com os trabalhadores que atuam, sob tal condição, no próprio STF, como Valdete e eu fizemos certa vez[vii].

Saberia, então, que há lá trabalhadores terceirizados trabalhando sem registro em carteira, sem receber verbas rescisórias dos contratos anteriores e trabalhando sem gozar férias há vários anos.
 
XV-

E a questão nem é tanto – e que já não é pequena – a da efetivação de direitos. O mais perverso mesmo da terceirização é o processo de invisibilidade. O fato de se trabalhar em local por vários anos, como acontece, em geral, nas repartições públicas, e não ter integração social alguma no respectivo local.

Para esse evento festivo, fiz convite expresso e pessoal aos trabalhadores terceirizados e às trabalhadoras terceirizadas que atuam no Tribunal, acompanhado de uma entrevista para que melhor pudesse conhecê-los, como conhecia os que trabalhavam no Fórum de Jundiaí, onde exerci a função de diretor, desde 2002.

A felicidade que demonstravam ao serem convidados constituíram momentos muito bonitos, segundo disseram os servidores do gabinete, que estiveram comigo nesse ato, mas são, ao mesmo tempo, a representação de uma triste realidade que atinge 12 milhões de trabalhadores em todo o país, em todos os tipos de locais de trabalho.

Vejo alguns deles aqui no auditório. Estejam certos que é uma honra muito grande para mim a presença de vocês.

E a resposta dada, de forma unânime, a uma das perguntas reflete bem o equívoco do encaminhamento sociológico e jurídico dada à questão pelo STF. Indagados se queriam ser integrados, como trabalhadores efetivos do Tribunal, todos, sem exceção, responderam: SIM.
 
XVI-

Há, portanto, várias razões jurídicas, sociais, econômicas e humanas para que aquele ideal de solidariedade e de alteridade desenvolvido e consagrado na Constituição de 1988 seja mantido em pleno vigor.

Mas essa não é uma tarefa de alguns iluminados, vez que depende da compreensão e da dinâmica populares, ou que se possa, ao meu ver, ser imposta pela força ou pelo ódio.

É preciso consciência, tolerância, convencimento e, antes de tudo, muita coragem para se permitir adquirir conhecimento e transformar em um novo ser humano.

Isso não é novidade para ninguém. É o óbvio, bem sei. Mas como já disse o poeta mineiro, Beto Guedes: “Quero te dizer nenhum segredo. Falo desse chão da nossa casa. Vem que tá na hora de arrumar. (...) Vamos precisar de todo mundo, pra banir do mundo a opressão.”
 
XVII-

E mesmo que já se tenham verificado muitas baixas dentre aqueles que compunham a geração que conduziu os processos históricos de lutas pela formalização e pela efetivação dos direitos sociais, novas gerações de jovens estudantes, com muito maior vigor, capacidade intelectual e conhecimento, têm reativado esse compromisso e deixado claro, inclusive, que para se chegar a um mundo realmente viável à existência humana é preciso atingir estágios reais de igualdade e de superação de todas as formas de opressão e de alienação da condição humana.

É por esses ensinamentos que agradeço imensamente a vocês, queridas amigas e queridos amigos, dessas novas gerações e, de modo muito especial, aos parceiros e parceiras do Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital - GPTC, também por me possibilitarem viver o tempo presente.
 
XVIII-

Aliás, pensando nisso, lembrando dos intensos ataques midiáticos desferidos contra a Justiça do Trabalho, dentro de uma estratégia deliberada de tentar nos conduzir ao caos social para facilitar o aumento da exploração do trabalho e, com isso, majorar lucros de grandes empresas e do capital especulativo, de modo a minimizar a crise nos países centrais ou simplesmente procurar manter padrões de Estado Social em referidos países, e verificando os efeitos danosos que esses ataques geram, na forma de um autêntico assédio moral coletivo, a tantos profissionais ligados à Justiça do Trabalho, essa que é uma das instituições mais sérias e importantes deste país, nada mais oportuno que uma mensagem de outro mineiro, Carlos Drummond de Andrade:
 
“Não serei o poeta de um mundo caduco
Também não cantarei o mundo futuro
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças
Entre eles, considero a enorme realidade
O presente é tão grande, não nos afastemos
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas
 
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
 
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente”
 
XIX-

O que este evento representa, no entanto, é que efetivamente não somos poucos e não somos fracos. Há uma quantidade enorme de pessoas que estão dispostas a levar adiante o projeto de elevação da condição humana em todos os aspectos, com superação da intolerância, das desigualdades sociais e de todas as formas de discriminação, com os necessários recordes de gênero, de raça e de orientação sexual.

Não há razão, portanto, para que nos deixemos abalar pela desesperança, pelas incertezas e menos ainda, pelo medo do conhecimento ou pelo medo da transformação pessoal.

No mínimo, é preciso não ter medo de dizer o óbvio, fazendo referência à vida concreta e às pessoas reais, sempre que se tiver a oportunidade da fala.

Se isso parecer pouco, não é motivo para que não seja feito, pois os sentimentos, que conduzem a grandes ações, brotam da percepção das pequenas coisas.

?Então, parem tudo, e vejam:
 
“Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
 
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor. 
 
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
 
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio”
 
Muito obrigado!


Fonte:  Portal CTB - 24/09/2018


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