Artigo - Dengue e "falta" de médicos

O Brasil não é pra amadores, diz o ditado. E não é mesmo. Neste momento, o País vive epidemia de dengue, em plena década de 20, do Século 21. Segundo matéria da Agência Brasil, do dia 22, o “Ministério da Saúde contabiliza mais de dois milhões de casos de dengue no em 2024.” – 1

“Do total de 2.010.896 casos prováveis, 682 resultaram em morte – número que pode aumentar, uma vez que há ainda 1.042 óbitos em investigação. Conforme balanço divulgado pelo Ministério, o coeficiente de incidência da doença está em 990,3 casos para cada grupo de 100 mil habitantes.”

Em matéria no Correio Braziliense, sábado (23), “Faltam médicos na rede pública de saúde”, e “Ibaneis governador reconhece que faltam médicos na rede pública de saúde” – 2 – no online do veículo, mostra o caos da saúde pública da Capital Federal, que tem a renda per capita mais alta do Brasil.

Segundo a matéria, de janeiro até aqui, os casos cresceram 461%. “De janeiro até agora morreram 152 pessoas e outras 162.665 foram infectadas, de acordo com dados do boletim epidemiológico publicado ontem [sexta-feira] pelo Ministério da Saúde.”

Para especialistas ouvidos pela Agência Senado, a “situação é alarmante porque o pico da dengue ainda não chegou – normalmente é em abril – e a doença pode levar à morte. “Eles apontam que os cidadãos também são responsáveis e que o poder público – embora isso nem sempre seja tão evidente – tem parcela grande de culpa pela atual epidemia.” – 3
Ibaneis não sabe como resolver

Na matéria do Correio, o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB) diz que não sabe como resolver o problema.

“O governador Ibaneis Rocha afirmou sexta-feira que o DF vive uma crise em todos os hospitais públicos e privados por conta da epidemia de dengue. Ele admitiu a existência de um déficit grande de médicos que o governo local não está conseguindo suprir”, escreve a matéria.

“Não encontramos esses profissionais pra contratar. Para vocês terem uma ideia, de uns 60 médicos que nós convocamos no mês passado, só oito assumiram na rede pública. Então, é um problema muito sério. Nós precisamos encontrar uma maneira de resolver”.
País ‘sem médicos’

Esse é o problema. E o Estado brasileiro, tudo indica, não se interessa em resolver. Isto porque a falta de médicos, sobretudo no Interior, não afeta a elite econômica. Aqui, quem é rico não tem problema as mazelas brasileiras: saúde precária e desassistida, educação pública abandonada, insegurança, violência urbana, desemprego, entre outros.

A declaração do governador do DF é a senha para a constatação de que o Estado não tem interesse em resolver esse e outros graves problemas sociais.

Até que o governo Dilma tentou enfrentar e resolver ou amenizar o problema, ainda que de forma precária, com a criação do Programa Mais Médicos, em 2013, cujo objetivo era suprir a carência de médicos nos municípios do Interior e nas periferias das grandes cidades.
O Programa levou 15 mil médicos para as áreas onde faltavam profissionais. Foi duramente criticado pela mídia e médicos brasileiros, que compõem certa casta de profissionais no País.

Interior do Brasil

“O atendimento médico vive atualmente infame contradição: embora se formem cada vez mais profissionais por ano, a saúde pública ainda carece de atendentes – principalmente em hospitais do Interior” – 4 – chama atenção o portal Soul Medicina.

Embora iniciativas como o Mais Médicos tenham melhorado a situação em municípios menores, mais da metade dos doutores ainda estão concentrados nas capitais brasileiras.

Nacionalmente, a média é de 2,18 médicos pra cada mil habitantes, o que cumpre a recomendação da Organização Mundial de Saúde – 1 atendente por 1 mil habitantes. Contudo, essa razão difere muito entre Capital e outros municípios do mesmo Estado.

Qual a solução

O problema tem solução. Mas é preciso ter coragem e enfrentar essa questão, que é estrutural. Há exemplos no mundo. E, talvez, o do Reino Unido seja o mais interessante. Como o Estado britânico resolveu esse problema? Lá, depois de formado, o médico presta dois anos de serviços ao National Health Service. Trata-se, do SUS britânico, referência mundial, que orgulha o povo local. Esse sistema é formado por rede de clínicas e hospitais públicos. Atendimento gratuito.

No Reino Unido, o médico deve realizar dois anos do Foundation Programme – programa estruturado de aprendizado no local de trabalho pra médicos juniores, que forma ponte entre a faculdade de medicina e o treinamento especializado – para iniciar o treinamento como especialista em qualquer área que tenha interesse.

Ao final do primeiro ano, o médico recebe a full licence (licença completa).

Talvez seria como se, após a graduação no Brasil, o CFM requeresse dois anos no SUS de forma supervisionada, pra demonstrar capacitação e prosseguir o treinamento. A diferença é que tanto esses dois anos quanto os próximos anos todos serão baseados no Reino Unido.


Marcos Verlaine
É jornalista, analista político e assessor parlamentar do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap)

 

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